O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a atribuição de 80.000 euros de indemnização por danos não patrimoniais sofridos por uma mulher em resultado da perfuração do seu intestino durante a realização de uma colonoscopia que lhe provocou uma infeção e a deixou em perigo de vida.

O caso

Uma mulher sofreu uma perfuração do intestino durante a realização de um exame de colonoscopia, sem que essa situação tivesse sido detetada a não ser quando a doente, face ao agravar das dores, que cada vez eram mais fortes e insuportáveis, recorreu a outro hospital onde foi diagnosticada a existência de uma infeção resultante dessa perfuração.

Em perigo de vida, foi sujeita a várias intervenções cirúrgicas e a um demorado e complicado período de recuperação. Responsabilizando o médico e o hospital pelo sucedido, a mulher intentou contra eles uma ação na qual pediu para ser indemnizada pelos danos que sofrera.

A ação foi julgada parcialmente procedente e o médico e a sua seguradora condenados a pagar uma indemnização à doente no valor de 150.000 euros por danos não patrimoniais e de 4.594,13 por danos patrimoniais. Porém, essa decisão foi revogada pelo Tribunal da Relação do Porto (TRP), o qual absolveu o médico e a seguradora ao considerar que ficara por provar a ilicitude da conduta do médico uma vez que não se demonstrara nenhum erro médico que estivesse na origem da perfuração do intestino. Inconformada, a doente recorreu para o STJ que concedeu provimento ao recurso, responsabilizando o médico pelos danos causados à paciente, mas remetendo o processo de novo para o TRP para que este se pronunciasse sobre o montante da indemnização a atribuir. Este fixou o valor da indemnização em 80.000 euros por danos não patrimoniais e em 2.965,88 por danos patrimoniais, decisão da qual a autora recorreu para o STJ defendendo a manutenção do que havia sido decidido em primeira instância no que toca à indemnização por danos não patrimoniais, então fixada em 150.000 euros.

Apreciação do Supremo Tribunal de Justiça

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso, confirmando o montante da indemnização, ao decidir que, face à gravidade dos danos sofridos, os critérios seguidos pelo Tribunal da Relação para a fixação desse montante estavam de acordo com os observados em situações análogas ou equiparáveis.

Segundo o STJ, o fundamento e o objetivo da indemnização pela perda do direito à vida não é o mesmo que preside à indemnização por danos não patrimoniais de que beneficia o próprio lesado.

Embora o direito à vida seja o mais valioso de todos os direitos, os valores indemnizatórios que os tribunais vêm atribuindo por morte, que, na maioria dos casos, oscilam entre os 50.000 e os 80.000 euros, não são limitativos das indemnizações fixadas por danos não patrimoniais, nomeadamente em casos em que os lesados sobreviveram com lesões de extrema gravidade e fortemente incapacitantes.

Para determinar o montante da indemnização a atribuir por danos não patrimoniais, ressarcíveis desde que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, deve o tribunal decidir segundo a equidade, tomando em consideração o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.

Este recurso à equidade não afasta, no entanto, a necessidade de observar as exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uma uniformização de critérios, naturalmente não incompatível com a devida atenção às circunstâncias do caso.

Tratando-se de uma indemnização fixada pelas instâncias segundo a equidade, mais do que discutir a aplicação de puros juízos de equidade que, em rigor, não se traduzem na resolução de uma questão de direito, num recurso de revista importa essencialmente verificar se os critérios seguidos e que estão na base de tais valores indemnizatórios são passíveis de ser generalizados e se se harmonizam com os critérios ou padrões que, numa jurisprudência atualista, devem ser seguidos em situações análogas ou equiparáveis.

Resultando da factualidade provada que como consequência da perfuração do intestino ocorrida no decurso da execução de uma colonoscopia, a autora teve um sofrimento significativo, apercebeu-se do perigo da perda da vida, foi submetida a diversas intervenções cirúrgicas subsequentes, passou a sofrer de limitações na sua vida em face da visibilidade das cicatrizes, ficou com uma incapacidade geral permanente de 16 pontos, e sendo certo que o grau de culpa do lesante se situa no campo da negligência legalmente presumida, considerou o STJ adequado confirmar o montante de 80.000 fixado pelo Tribunal da Relação a título de danos não patrimoniais.

Via | LexPoint

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo n.º 2104/05.4TBPVZ.P1.S1, de 8 de junho de 2017

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