O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que ao vendedor de um automóvel em segunda mão, que assegure o bom funcionamento mecânico do veículo, cabe, para comprovar a sua situação de desconhecimento não culposo dos defeitos mecânicos, demonstrar que tinha efetuado uma revisão completa ao veículo, na marca ou em estabelecimento credenciado, incidindo sobre os aspetos mais decisivos para o bom funcionamento mecânico, como o motor, a parte elétrica e a caixa de velocidades.

O caso

Em abril de 2008, um homem comprou um automóvel usado, tendo-lhe sido dada uma garantia de bom funcionamento do veículo. Devido a várias avarias, o novo proprietário viu-se obrigado a substituir o motor do veículo, tendo ficado mais de um mês privado de utilizar a viatura.

Responsabilizando o vendedor pelo sucedido, recorreu a tribunal exigindo o pagamento do custo de reparação do veículo e as despesas que tinha tido com o aluguer de outros automóveis, atendendo à privação de uso da viatura.

O vendedor negou qualquer responsabilidade, alegando que vendera o automóvel em perfeitas condições e que este tinha sido experimentado pelo comprador, na companhia de um mecânico seu amigo. A ação foi julgada integralmente procedente, e o vendedor condenado a pagar as quantias reclamadas pelo comprador, decisão da qual recorreu para o Tribunal da Relação do Porto.

Apreciação do Tribunal da Relação do Porto

O Tribunal da Relação do Porto (TRP) negou provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida, ao decidir que ao vendedor de um automóvel em segunda mão, que assegure o bom funcionamento mecânico do veículo, cabe, para comprovar a sua situação de desconhecimento não culposo dos defeitos mecânicos, demonstrar que tinha efetuado uma revisão completa ao veículo, na marca ou em estabelecimento credenciado, incidindo sobre os aspetos mais decisivos para o bom funcionamento mecânico, como o motor, a parte elétrica e a caixa de velocidades.

Estando em causa uma compra e venda civil genérica, feita entre dois particulares, não exercendo o vendedor com caráter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios, não é de aplicar a regulamentação específica da compra e venda de bens de consumo.

Nesse sentido, diz a lei que o comprador tem o direito de exigir do vendedor a reparação da coisa ou, se for necessário e esta tiver natureza fungível, a substituição dela, salvo se o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou a falta de qualidade da coisa.

Sendo evidente que o vendedor ignorava, no momento do negócio, os defeitos de que padecia o automóvel, uma vez que este não possuía defeitos aparentes, tal não é suficiente para afastar a responsabilidade do vendedor.

Isto porque lhe competia ter realizado uma inspeção na própria marca, ou uma inspeção especificamente orientada para detetar deficiências em órgãos vitais do veículo, e não uma mera inspeção ou revisão genérica. Só assim seria possível afirmar que desconhecia, sem culpa, o vício ou a falta de qualidade da coisa.

Não o tendo feito, não logrou o vendedor afastar a sua presunção de culpa, pelo que nenhum obstáculo existia a que se afirmasse a sua responsabilidade face às consequências da compra e venda de coisa defeituosa.

Via | LexPoint

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 267/09.9TBVLG.P1, de 16 de maio de 2017

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