O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que é legítimo a seguradora recusar o pagamento da indemnização quando, no momento da morte, o segurado apresentava uma taxa de álcool no sangue superior ao valor a partir do qual, segundo as condições da apólice, ficava excluída a cobertura do seguro.

O caso

Em 2002, um casal comprou uma casa com recurso a empréstimo bancário, no âmbito do qual subscreveu uma apólice de seguro de vida para garantir o pagamento desse mesmo empréstimo em caso de morte ou invalidez total e permanente.

Em 2014 o marido morreu em consequência de uma queda, mas a seguradora recusou-se a pagar a indemnização alegando que o falecido sofria de alcoolismo, estava alcoolizado no momento em que caíra, apresentando uma taxa de alcoolemia de 1,45 gramas por litro, e que a apólice excluía quaisquer ações ou omissões praticadas pela pessoa segura quando acusasse consumo de estupefacientes ou um grau de alcoolemia superior a 0,5 gramas por litro. Isto apesar de no momento da subscrição o marido ter declarado que consumia uma garrafa de vinho verde por dia.

Inconformada, a viúva recorreu para tribunal, o qual condenou a seguradora a pagar os montantes em dívida ao banco, por conta do empréstimo, decisão da qual foi interposto recurso para o TRP.

Apreciação do Tribunal da Relação do Porto

O TRP julgou procedente o recurso, absolvendo a seguradora, ao decidir que é legítimo esta recusar o pagamento da indemnização quando, no momento da morte, o segurado apresentava uma taxa de álcool no sangue superior ao valor a partir do qual, segundo as condições da apólice, ficava excluída a cobertura do seguro.

A cláusula do contrato de seguro de vida que exclua a cobertura quando o risco decorra de atos praticados quando o segurado apresente uma determinada taxa de alcoolemia não deve ser interpretada como exigindo um nexo de causalidade entre o álcool e a morte do segurado.

Segundo o TRP, basta que no momento do sinistro o segurado apresente uma taxa de alcoolemia superior ao valor mínimo definido na apólice para que o evento deixe ter ser coberto pelo seguro.

Assim, não atua em abuso de direito a seguradora que invoca essa cláusula de exclusão para afastar a sua responsabilidade apesar de na declaração sobre o seu estado de saúde o segurado ter declarado que consumia diariamente 0,75 l de vinho verde. Tal declaração e o consequente conhecimento pela seguradora desse consumo diário não acarreta a revogação tácita da cláusula de exclusão, nem permite concluir que a seguradora tenha aceitado a eficácia do contrato mesmo que o segurado apresentasse uma taxa de álcool no sangue de 0,5 gramas por litro no momento da morte.

Mais, tendo esse estado inicial do segurado agravado e evoluído para um diagnóstico compatível com Síndrome de Dependência Alcoólica, estava o mesmo obrigado a comunicar essa alteração à seguradora, na medida em que dela resultava um acentuado agravamento do risco inicial com base no qual o contrato fora celebrado. Não o tendo feito, o segurado não agiu de acordo com o que lhe era imposto pela boa-fé.

Como tal, concluiu, o TRP, é legítima a recusa da seguradora em pagar a indemnização, com fundamento na cláusula de exclusão da cobertura do seguro, independentemente da morte do segurado ter ou não resultado do consumo de álcool.

Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 332/17.9T8MCN.P1, de 12 de fevereiro de 2019  

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