O Tribunal da Relação de Guimarães (TRG) decidiu que no seguro de responsabilidade civil automóvel por danos próprios, quando nada seja convencionado em contrário, não há lugar ao pagamento de indemnização pela privação do uso do veículo.

O caso

O marido da proprietária de um automóvel sofreu um acidente ao volante deste perdendo o controlo do mesmo até embater num murete e cair com o veículo dentro de um tanque cheio de água.

Como o veículo tinha seguro contra danos próprios, a proprietária participou o acidente à seguradora. Mas esta, depois de efetuadas as necessárias averiguações, declinou qualquer responsabilidade ao concluir que o acidente havia sido propositadamente provocado para infligir danos no veículo que, conjuntamente com danos anteriores, nomeadamente no motor, permitissem criar a aparência de que todos os danos tinham resultado do acidente com a consequente perda total do mesmo.

Findos os vinte dias durante os quais, segundo o seguro, a proprietária pôde dispor de um veículo de substituição,  a mesma viu-se privada de qualquer veículo, tendo recorrido a tribunal pedindo para que a companhia de seguros fosse condenada a pagar-lhes os 15.300 euros previstos no contrato para a perda total do veículo e 35 euros diários pela privação do respetivo uso.

O tribunal julgou a ação procedente, tendo a seguradora recorrido para o TRG pedindo para que a decisão fosse revogada na parte em que a condenara no pagamento de indemnização pelo alegado dano de privação do uso do veículo seguro.

Apreciação do Tribunal da Relação de Guimarães

O TRG concedeu provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida na parte em que condenara a seguradora a pagar uma indemnização pela privação do uso de veículo.

Decidiu o TRG que no seguro de responsabilidade civil automóvel por danos próprios, quando nada seja convencionado em contrário, não há lugar ao pagamento de indemnização pela privação do uso do veículo.

Sendo o seguro de responsabilidade civil automóvel por danos próprios facultativo, é deixado à vontade das partes convencionar livremente qual o âmbito da cobertura e quais os danos a indemnizar.

Nesta modalidade de seguro, a lei instituiu como regime supletivo um princípio indemnizatório que diverge do regime geral, segundo o qual o segurador apenas responde pelos lucros cessantes resultantes do sinistro quando tal tenha sido convencionado.

Assim, se nada for convencionado em contrário ou diversamente, designadamente em matéria de privação de uso do bem, é esse regime supletivo que deve ser tido em conta.

Como tal, contemplando o seguro contratado o pagamento de uma indemnização em caso de perda total no valor de 15.300 euros e a entrega de uma viatura de substituição, por um período máximo de 20 dias por ano, em caso de acidente, não pode o segurado reclamar o pagamento de qualquer indemnização pela privação de uso de veículo depois de decorridos esses vinte dias e da seguradora se ter recusado a proceder ao pagamento da indemnização com fundamento em alegada fraude.

E embora seguradora tivesse um prazo de 30 dias para tomar uma posição sobre a participação do sinistro, esse prazo fica suspenso em caso de suspeita fundamentada de fraude, o que também obstaria sempre a que a seguradora pudesse ser condenada a indemnizar pelo dano de privação do uso do veículo, com fundamento na ultrapassagem desse prazo.

Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no processo n.º 291/15.2T8FAF.G1, de 15 de dezembro de 2016

Subscreve a newsletter e recebe os destaques do UDIREITO.