O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que não assume gravidade suficiente para justificar o despedimento com justa causa o envio por uma trabalhadora de limpeza a prestar funções junto de um estabelecimento de ensino de uma mensagem injuriosa, via Facebook, a uma aluna desse mesmo estabelecimento, fora do tempo e do local de trabalho, a respeito de assuntos pessoais.

O caso

Uma trabalhadora de limpeza colocada pela sua entidade patronal a exercer funções num instituto superior foi despedida depois de ter enviado uma mensagem a uma aluna desse mesmo instituto, via Facebook, injuriando-a e ameaçando-a.

Mensagem essa que levou a que a aluna apresentasse queixa junta da direção do instituto, a qual exigira a substituição imediata da trabalhadora. Em causa estava um desentendimento existente entre ambas, do foro privado e alheio ao estabelecimento de ensino.

Inconformada com essa decisão, a trabalhadora impugnou judicialmente o despedimento, tendo o tribunal concluído pela ilicitude do mesmo, condenando a entidade patronal a indemnizá-la, decisão da qual foi interposto recurso para o TRL.

Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa

O TRL julgou improcedente o recurso ao decidir que não assume gravidade suficiente para justificar o despedimento com justa causa o envio por uma trabalhadora de limpeza a prestar funções junto de um estabelecimento de ensino de uma mensagem injuriosa, via Facebook, a uma aluna desse mesmo estabelecimento, fora do tempo e do local de trabalho, a respeito de assuntos pessoais.

Segundo a lei, para que exista justa causa de despedimento é necessário que se verifique um comportamento culposo do trabalhador, violador dos seus deveres laborais, que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

Nessa linha de entendimento, a jurisprudência dos tribunais superiores vem reafirmando que essa impossibilidade prática e imediata de subsistência da relação laboral se verifica quando, perante um comportamento ilícito, culposo e com consequências gravosas na relação laboral, ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, suscetível de criar no espírito da primeira a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral.

Estando em causa uma mensagem enviada pela trabalhadora, via Facebook, para uma aluna do estabelecimento de ensino, cliente da empregadora, para o qual prestava funções, num sábado, fora do tempo e do local de trabalho, a respeito de assuntos pessoais, a mesma constitui um ato da vida privada da trabalhadora.

Contendo essa mensagem ameaças de divulgação de um assunto da vida privada da aluna junto dos utentes desse estabelecimento, o que motivou uma queixa da aluna junto desse estabelecimento que, por sua vez, apresentou uma reclamação junto da empregadora prestadora de serviços, que exigiu a substituição da trabalhadora, sob pena de pôr em causa a continuidade do contrato, tal conduta constitui um ilícito disciplinar, por violação do dever de lealdade, que obrigava a trabalhadora a não assumir condutas suscetíveis de pôr em crise os interesses empresariais da sua entidade patronal.

Só que essa infração disciplinar não reveste gravidade suficiente para justificar a adoção da medida disciplinar mais gravosa de despedimento. Tendo os danos resultantes da conduta da trabalhadora se limitado à apresentação de reclamação por parte do estabelecimento de ensino, sem que tenha ficado provado que essa mesma conduta afetou a execução do contrato, ou que a tenha provocado medo ou constrangimento à aluna, é de considerar desajustada a aplicação de uma sanção expulsória, pelo que o despedimento deverá ser declarado ilícito.

Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 15070/18.T8LSB.L1-4, de 11 de julho de 2019

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