O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que, de forma legítima e não inconstitucional, a lei, relativamente aos contratos de arrendamento para habitação celebrados antes da entrada em vigor do Novo Regime do Arrendamento Urbano, deixou de permitir a transmissão do arrendamento para os descendentes maiores de 26 anos que não sofram de qualquer incapacidade ou que tenham uma incapacidade inferior a 60%.

O caso

Os proprietários de um imóvel arrendado há mais de 50 anos recorreram a tribunal pedindo que o mesmo lhes fosse entregue pelo filho da arrendatária que o continuava a habitar depois da mãe ter morrido, em agosto de 2017. Aquele contestou a ação, alegando que vivia na casa há 47 anos e que estava desempregado e sem condições para arrendar outra habitação. Mas a ação foi julgada procedente e ordenada a entrega do imóvel, decisão da qual foi interposto recurso para o TRP.

Apreciação do Tribunal da Relação do Porto

O TRP julgou improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida, ao decidir que, de forma legítima e não inconstitucional, a lei, relativamente aos contratos de arrendamento para habitação celebrados antes da entrada em vigor do Novo Regime do Arrendamento Urbano, deixou de permitir a transmissão do arrendamento para os descendentes maiores de 26 anos que não sofram de qualquer incapacidade ou que tenham uma incapacidade inferior a 60%.

Anteriormente a lei permitia a transmissão do arrendamento, por morte do arrendatário ou do cônjuge sobrevivo para quem houvesse sido transmitido o direito ao arrendamento, para os descendentes que com ele convivessem há mais de 1 ano, independentemente da sua idade e da verificação de qualquer situação de incapacidade. Mas agora, para esses contratos mais antigos, a lei apenas admite a transmissão do arrendamento para filho do arrendatário ou do cônjuge deste, para quem tenha sido transmitido o direito ao arrendamento, desde que tenha menos de 1 ano de idade ou com ele convivesse há mais de 1 ano e fosse menor de idade ou, tendo idade inferior a 26 anos, frequentasse o 11.º ou 12.º ano de escolaridade ou estabelecimento de ensino médio ou superior ou, sendo maior de idade, com ele convivesse há mais de 1 ano e fosse portador de deficiência com grau comprovado de incapacidade superior a 60%.

Com esta limitação, reforçou-se o cariz social da transmissibilidade da posição de arrendatário, restringindo-se esta aos descendentes que, em princípio, terão dificuldade económica em aceder ao gozo de uma habitação segundo as regras atuais do mercado, entendendo o legislador não ser a mera convivência, no locado, com o arrendatário falecido suficiente para motivar a imposição de sacrifícios ao interesse do senhorio, em ver cessado o contrato sujeito a um regime vinculístico, e ao interesse público, de ampliação do mercado de arrendamento, cedendo o interesse daqueles perante estes.

Segundo o TRP, a aplicação desse regime transitório não enferma de inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade, uma vez que não se verifica qualquer discriminação injusta e arbitrária, pois cabe a esses descendentes, agora excluídos, diligenciar, ativamente, pela satisfação das suas necessidades, sendo que os casos verdadeiramente merecedores de proteção, face à sua vulnerabilidade, continuam abrangidos pela transmissão do arrendamento.

Não se encontrando o réu em nenhuma das situações previstas na lei, como admitindo a transmissão do arrendamento, é de concluir pela caducidade do mesmo, com a morte da sua mãe, e pela obrigação de entrega do imóvel ao senhorio.

Via | Lexpoint
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 2346/18.2T8GDM.P1, de 7 de outubro de 2019

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