O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que não constituem conversas informais, podendo ser valoradas pelo tribunal, as declarações recolhidas pelas forças policiais após a notícia do crime e antes de ter sido instaurado o inquérito e do suspeito ter sido constituído arguido.

O caso

Uma mulher foi condenada numa pena de multa e de prisão, esta suspensa na sua execução, pela prática de dois crimes de exploração ilícita de jogo, depois de ter colocado no seu estabelecimento comercial máquinas eletrónicas destinadas à prática de jogos de fortuna ou azar.

Inconformada com a sua condenação, a mulher recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa defendendo que havia sido condenada apenas com base nas declarações do militar da GNR que procedera à apreensão das máquinas e que transmitira o que ela lhe havia dito na altura, designadamente que era a responsável pelo estabelecimento.

Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa

O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL)  apenas ordenou que o tribunal recorrido se pronunciasse sobre a possibilidade de substituição da pena de prisão aplicada à arguida por outras penas alternativas, tendo quanto ao mais confirmado a decisão recorrida.

Decidiu o TRL que não constituem conversas informais, podendo ser valoradas pelo tribunal, as declarações recolhidas pelas forças policiais após a notícia do crime e antes de ter sido instaurado o inquérito e do suspeito ter sido constituído arguido.

A lei não impede os agentes policiais de deporem sobre factos por eles detetados e constatados durante a investigação de um crime, sendo apenas irrelevantes as provas que tenha sido extraídas de conversas informais mantidas entre esses mesmos agentes e os arguidos, ou seja, declarações obtidas à margem das formalidades e das garantias que a lei processual impõe.

Visa-se, assim, impedir, com a proibição dessas conversas informais, que se frustre o direito do arguido ao silêncio, o qual seria posto em causa através da confissão por ouvir dizer relatada pelas testemunhas.

Mas essa questão só se coloca quando exista já um inquérito e haja condições para a constituição de arguido. Antes disso cabe às forças policiais recolher indícios da infração de que a autoridade policial acaba de ter notícia, praticando os atos necessários e urgentes para assegurar os meios de prova, entre os quais, colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime.

Essas informações que então forem recolhidas pelas autoridades policiais são necessariamente informais, dada a inexistência de inquérito. Ainda que provenham de eventual suspeito, essas informações não são declarações em sentido processual, precisamente porque ainda não existe processo, resultando apenas do cumprimento de obrigações legais impostas às forças policiais pela necessidade de documentar a prática do ilícito e suas sequelas. Mesmo quando estejam em causa afirmações proferidas, de forma livre e espontânea, pelo futuro arguido.

Só não será assim quando as forças policiais tenham, de forma culposa, atrasado a formalização da constituição do arguido. Se ainda não havia obrigação de constituição como arguido e as entidades policiais agiram dentro dos poderes concedidos pelas normas reguladoras da aquisição e notícia do crime e de medidas cautelares e de policia, tendo as autoridades ouvido do cidadão ou suspeito a informação da prática de um crime, isso não constitui violação de lei ou fraude à lei, nem obtenção de prova proibida.

Via | LexPoint

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 320/14.7GCMTJ.L1-9, de 22 de junho de 2017   

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