O Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) condenou a Ordem dos Advogados (OA) a inscrever como advogada uma estagiária que exercia simultaneamente a atividade de gerente de uma sociedade de administração de condomínios, por esta não ser uma atividade incompatível com o exercício da advocacia.

A eventual angariação de clientela para a profissão não é relevante para efeitos de incompatibilidade, mas pode ser considerada para efeitos disciplinares no caso de um advogado fazer uso real desse cargo para ganhar clientes.

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O caso

Após a conclusão e aprovação no estágio, uma advogada estagiária requereu a sua inscrição definitiva na OA, mas o seu pedido foi rejeitado com fundamento no facto de ela ser gerente de uma sociedade de administração de condomínios, atividade que a Ordem considerou ser incompatível com o exercício da advocacia.

Inconformada, a estagiária apresentou uma intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias contra a OA, na qual pediu para que esta fosse intimada a inscrevê-la como advogada.

A intimação não obteve provimento, pois o tribunal entendeu que o meio processual utilizado não era o adequado para satisfazer a pretensão da estagiária, decisão da qual esta interpôs recurso para o TCAS.

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Apreciação do TCAS

O TCAS deu razão à advogada estagiária nas duas questões.

No entender do TCAS:
– a intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias constitui o meio adequado para peticionar a inscrição definitiva na OA; e que
– a inscrição pedida não pode ser recusada com fundamento no exercício simultâneo da atividade de gerente de sociedade de administração de condomínios.

Dispõe a lei que a intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, e não seja possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar.

Estando em causa um pedido de inscrição definitiva na OA, a sua apreciação não se compadece com uma definição cautelar, dado que são demasiado importantes os valores em causa para que os mesmos possam ser acautelados com uma simples decisão provisória, que pode ser alterada pela decisão a proferir no processo principal.

Por outro lado, uma ação administrativa especial que tenha por objeto tal matéria pode demorar vários anos, o que é incompatível com a exigência de que seja emitida de forma célere uma decisão sobre o pedido de inscrição, a fim de se assegurar o pleno e útil exercício da liberdade de escolha de profissão, na vertente de ingresso e acesso à profissão de advogado.

Portanto, a intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias é a única forma viável de assegurar, de forma célere, o exercício da liberdade de escolha de profissão, constituindo meio processual adequado para peticionar a inscrição definitiva numa Ordem Profissional.

Quanto ao exercício simultâneo da função de gerente de sociedade de administração de condomínios, o estatuto da OA contém uma enumeração exemplificativa de situações de incompatibilidade com o exercício da advocacia e uma regra geral segundo a qual esta é inconciliável com qualquer cargo, função ou atividade que possam afectar a isenção, a independência e a dignidade da profissão.

Segundo o TCAS, a atividade de gerente de sociedade de administração de condomínios não está elencada nas funções e atividades indicadas como incompatíveis nem é passível de afetar a isenção, a independência e a dignidade da profissão, a ponto de determinar essa incompatibilidade.

O facto de a gerência de sociedade de administração de condomínios poder conduzir à angariação de clientela não é relevante para efeitos de incompatibilidade, sendo apenas de considerar para efeitos disciplinares no caso de um advogado fazer, efetivamente, uso do seu cargo na sociedade como forma de angariação de clientela para a sua profissão.

Referências
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo n.º 12002/15, de 16 de abril de 2015
Código de Processo nos Tribunais Administrativos, artigo 109.º
Estatuto da Ordem dos Advogados, artigos 76.º n.º 2 e 77.º

(Imagem | OA)
Via | LexPoint

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